terça-feira, 19 de maio de 2009


Hora do recreio

Sentei e abri a lancheira. O papel laminado promete boas surpresas, lanchinhos deliciosamente preparados pela mamãe. Já não agüento de fome, hora do recreio, a barriga roncando e a boca salivando.
Percebo agora o carinho com que meu lanche fora preparado. Mãos amorosas o rechearam e embrulharam. Só Deus sabe o quanto devo à minha mãe. Minha querida mãe.
Como um pouco apressado, pois a aula já vai recomeçar, pena que desta vez não tenha trazido a garrafinha plástica tampada com reforços de plástico para não vazar. Coca-Cola já morna e quase sem gás, mas até isso tem um gosto diferente, lembranças saborosas. Como aquela bala “Banda” dos palhacinhos (a única bala que gostei em toda a minha vida), a corrida até o gira-gira e a toalhinha bordada com o nome do “filhote”, o meu.
Outras cores, outros sabores... Mas o carinho e amor no preparo da “lancheira” é o mesmo. A mesma preocupação para que o filhinho se alimente bem, cresça forte o menino.
Poucas coisas mudaram. Somente o fato de que agora sou professor, não mais aluno (serei sempre aluno!), a lancheira é disfarçada na minha mochila cheia de livros e importâncias e no recreio não corro mais para o gira-gira, mas sim para a “sala dos professores”.
Só isso mesmo! Por dentro o menino é o mesmo. Talvez um pouco menos (bem pouco!) mimado, com mais deveres de casa, não come mais bala “Banda” (não mais existe), e que aos poucos se torna um “homenzinho”.


TiTo Igatha
14/09/2004
Aos Estranhos

Passei um trecho de Pedro Juan Gutierrez (trilogia suja de Havana) para leitura e interpretação. A citação tem como idéia básica, a intolerância para com todos aqueles que têm idéias próprias, os “desajustados”. E ele dá uma lista que vai desde maconheiro até punheteiro, de macumbeiro a sapatona.
A idéia inicial é mesmo trabalhar a compreensão e interpretação, mas com um trecho instigante, de um livro mais instigante ainda. Passar a idéia de que todos aqueles que são postos à margem, são justamente por não se enquadrar no esquema “soldadinho”. E que não devem desistir e abandonar suas convicções por mais que nos quebrem a vontade. Que todos aqueles que de uma forma ou de outra bateram de frente com o estabelecido acabaram por encontrar seu caminho e tornaram-se referência. John Lennon era um péssimo aluno de matemática, Van Gogh era “louco” (embora eu conteste), o outro viciado e assim por diante.
Com certeza, muitos alunos passaram longe de uma boa compreensão desta natureza e se prenderam nos termos chocantes, tipo veado, maconheiro e puta. Mas a grande maioria (à noite principalmente) fez um verdadeiro exercício de paciência e obstinada luta contra a própria tendência a não pensar. Esses me dão a mesma felicidade daqueles que mostram a compreensão plena nos seus olhos brilhantes e questionadores. Parabéns aos bailarinos, roqueiros, grafiteiros, desenhistas, e todos os que já foram, são e serão considerados estranhos (Átopos-Grego). Nas suas casas, escolas e por toda e toda eternidade. Amém.

TiTo Igatha
04/03/2008